terça-feira, 29 de dezembro de 2020

A INCRÍVEL SAGA DA PRIMEIRA ÓPERA - ROCK BRASILEIRA...

   - Quando o popularesco  Odair José desagradou a censura, a igreja e, à época, os fãs – 

Se alguém lhe perguntasse, que foi que gravou a primeira Ópera-Rock Brasileira, será que você saberia a resposta? Certamente iria responder que foram os Mutantes, o quem sabe, o Raul Seixas, Secos & Molhados? O Terço? ou outro nome dos anos 70? Não meus caros, o primeiro músico brasileiro a gravar uma ópera-rock foi o popularesco Odair José. Sim! Isso mesmo!!! Para quem desconhece, Odair José lançou seu disco de estreia em 1970. Daí para frente foi uma sucessão de álbuns e grandes hits como “Eu Vou Tirar Você Desse Lugar”, “Cadê Você?” e “Uma Vida Só (Pare de Tomar a Pílula)”. Por ter um estilo brega romântico-açucarado foi apelidado de “O Terror das Empregadas” – que deliravam quando suas músicas tocavam nos velhos e saudosos radinhos de pilha. Apesar do sucesso popular, Odair nunca caiu nas graças da crítica que o classificava como um artista de baladas melosas, musicalmente inferior ao que rolava no Brasil nos anos 70. Também foi perseguido pelas alas mais conservadoras da sociedade por tratar abertamente de temas como sexo em suas letras – um grande tabu na época.
Foi durante a leitura da obra O Profeta, do escritor líbano-americano Khalil Gibran, que teve a ideia de gravar um disco inteiro sobre a história de um profeta contemporâneo, contando como teria sido a vida de Jesus se ele tivesse nascido em tempos modernos. Escreveu um total de 24 canções e levou a ideia para a Phillips. Os executivos da gravadora detestaram a ideia e se recusaram a lançar tal disco. Contrariado, Odair não desistiu e foi conversar com a concorrente da Phillips, a RCA-Victor. Conseguiu assinar um contrato com a gravadora, mas teve de adaptar a obra original porque a RCA impôs a condição de que o disco deveria ser simples e não duplo como Odair planejava.
Enxugou as canções ao máximo e foi para o estúdio com 10 temas. Como estava ouvindo muito artistas como Peter Frampton, Joe Walsh e Jeff Beck, decidiu que gravaria um disco de rock operesco. Com guitarras, teclas e cozinha pesada.
Participaram das gravações: Jaime Alem (violão), Hyldon (guitarra), Robson Jorge (piano), José Roberto Bertrami (órgão e clarinete), José Lanforge (harmônica), Alex Malheiros (baixo) e Ivan Conti (bateria), os arranjos de cordas e metais ficou por conta de Don Charley. Odair além de cantar, tocou violão, guitarra e ajudou o conceituado Durval Ferreira na produção do disco. Com composições bem elaboradas O Filho de José e Maria retrata bem a vida do homem comum. O ser imperfeito, com relações familiares desgastadas, que acaba deixando-se cair nas armadilhas dos vícios e do sexo, que carrega consigo as perguntas que não poderão ser respondidas – “de onde venho?”, “pra onde vou?”, “qual o sentido da vida?”.
É musicalmente, uma mistura interessante de gêneros, com cada músico contribuindo de forma importante para o excelente trabalho final. Odair José conseguiu transitar vocalmente bem entre as emoções diferentes de cada uma das faixas. Os violões combinam perfeitamente com os sons delicados de órgão, a cozinha vai bem tanto nas baladas quanto nos temas mais pesados, o guitarrista Hyldon – que tocou muito tempo com Tim Maia – incrementou as músicas com sua pegada funkeada, o pianista Robson Jorge conseguiu transmitir a angustia do personagem em cada nota. Os arranjos de cordas de Don Charley ainda trazem uma sofisticação inestimável ao álbum. Quando foi lançado em 1977 O Filho de José e Maria foi um verdadeiro desastre comercial. A crítica não entendeu aquele conceito de ópera-rock ainda inédito no Brasil e ainda mais por ter sido um trabalho do "Rei das Domésticas". Os temas pesados foram mal recebidos pelo público cristão conservador que repudiou a história de um menino-messias fruto de um relacionamento fora do casamento que sofreu com a separação dos pais e passou por dilemas como a própria condição sexual, descrença religiosa e o abuso de drogas – Odair era usuário de maconha e cocaína na época. A igreja o classificou como um disco blasfêmico e ajudou a afastar o público cativo de Odair.
Em todos os cantos diziam que ele havia enlouquecido. Que o compositor de canções de amor tão belas não poderia ter concebido abominações como essas em suas plenas faculdades mentais. O efeito dessa antipropaganda empurrou as vendas do disco para baixo e culminou numa queda expressiva de popularidade de Odair – sua carreira nunca mais foi a mesma. Extraído do Blog.

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