domingo, 7 de julho de 2019

MARAVILHA QUE A FÚRIA DO TEMPO NÀO OFUSCOU....


















                                     
ARNALDO BAPTISTA - LÓKI? - 1974 - Não tem jeito. Vira e mexe me pego ouvindo o genial e alucinado Arnaldo Baptista, seja para exorcizar os fantasmas ou simplesmente para entrar em contato com a sua música sensível, perturbadora, mas de uma honestidade contagiante. O seu disco LÓKI?, lançado em 1974 é uma das maiores obras da Música Brasileira ou do Rock Tupiniquim, tanto faz.
Segue abaixo um texto sobre essa relíquia da nossa cultural musical. "Não é preciso guitarra pra fazer rock’n roll. Arnaldo Baptista sabia disso, como qualquer outro séquito da musicalidade revolucionária de Jerry Lee Lewis. A ausência desse instrumento deu protagonismo ao piano no primeiro disco solo do ex-integrante d’Os Mutantes. E isso tem um simbolismo curioso: Lóki? foi o registro em que Arnaldo lavou a alma após a ruptura com Os Mutantes e a separação da ex-mulher e ex-parceira Rita Lee.
Claro que tudo isso é velado. O músico havia afirmado que o alvo de suas composições angustiantes era a sociedade pós-contemporânea, o que não deixa de ser verdade se analisarmos faixas como “Não Estou Nem Aí” ou a doidivanas “Navegar de Novo”.
As ideias de Arnaldo são tão embaralhadas quanto uma espiral em movimento e, para isso, as divagações fragmentárias de “Navegar de Novo” atestam que não estamos diante de um ser normal. É um ser desiludido e atrapalhado. Desiludido com a impossibilidade de retornar com Os Mutantes, que havia perdido sua formação clássica no ano anterior. Desiludido com Rita Lee, chegando a provocá-la em “Cê Tá Pensando que Eu Sou Lóki?” (‘Cilibrina pra lá/Cilibrina pra cá’, em menção ao projeto Cilibrinas do Éden, que depois culminaria no grupo Tutti Frutti) e, por outro lado, se arrependendo e pedindo que a própria Rita o abrace em “Desculpe”.
‘Venho me apegando ao passado/Em ter você ao meu lado’, confessa o músico na primeira faixa, “Será Que Eu Vou Virar Bolor?”. É esse sentimento que vai permear toda a aventura pessoal e musical de Lóki?. E isso não se enquadra só em suas perdas sentimentais, mas também em suas fugacidades por meio de drogas como LSD, que chegaram a atrapalhar a cognição do músico (vide o documentário Lóki, de Paulo Henrique Fontenelle).
Reza a lenda que o álbum foi idealizado após um ataque nervoso, algo que não tem como discordar. Quando ele fala em bolor na primeira faixa, mostra temor a uma suposta caretice. Se ele se sente excluído por algo que não é (mofado e careta), em “Cê Tá Pensando que Eu Sou Lóki?” ele usa isso a seu favor: ‘Sou malandro velho e ninguém tem nada com isso/(…)Eu sou velho mas gosto de viajar/Por aí’.
Todas as dores claudicantes expostas fazem de Lóki? um registro único, e isso não se restringe às letras. A opção de não incluir guitarra o coloca à frente das rédeas, já que o disco não desvia nem um segundo de sua proposta rock’n roll. Não há de se sentir a falta do instrumento dominado por seu irmão Sérgio Dias (com quem chegou a discutir). Quer solo? Então se esbalde com os dedilhados inspiradores de “Honky Tonky (Patrulha do Espaço)”. O quesito ‘eletricidade’ é preenchido de forma soberba tanto pelo baixo de Liminha, como nas notas assertivas do clavinet, órgão ou dos sintetizadores de Arnaldo.
A musicalidade é outro fator potencial em Lóki?. Gravado no então moderno estúdio Eldorado com seus soberbos 16 canais, em São Paulo, é possível ouvir cada nota e cada acorde do álbum como se fôssemos testemunhas dessa transição pessoal de Arnaldo.
Além de conseguir os antigos parceiros de Mutantes Liminha (baixo), Dinho Leme (bateria) e o produtor Mazzola, o cantor trouxe Roberto Menescal para a produção e teve o suporte glorioso do maestro Rogério Duprat, que participou da maioria dos discos importantes da música brasileira naquele período (Gal Costa, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Walter Franco e muitos outros, fazendo valer a alcunha de ‘George Martin tupiniquim’).
Emoções, lucidez (e a falta dela) e solidão formam algumas passagens do que significa Lóki? na carreira de Arnaldo Baptista. Somos entregues a um comportamento visceral, tão doído quanto raivoso, o que coloca o disco em um pedestal sem igualdade. A dor e as angústias podem ter diminuído, ou até passado. Mas o peso e a inspiração do álbum formaram uma das obras mais instigantes da música brasileira".
O brilhante texto é de autoria de TIAGO FERREIRA, do Na Mira do Groove...

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