segunda-feira, 15 de julho de 2019

Livro reflete a importância do sonho para compreender o ser humano


                         
- 'O oráculo da noite - A história e a ciência do sonho', de pesquisador Sidarta Ribeiro, retrata a história e a ciência do mundo onírico -

 Quanto mais o homem avançou para as maravilhas da automação e da tecnologia, mais deixou de prestar atenção nos próprios sonhos. O mundo onírico perdeu o prestígio e passou mais de um século no escanteio. Diante das rotinas cotidianas, sobra pouco espaço para relatos sobre restos de memórias processados pelo cérebro durante o sono. Mas sonhar é importante. É bom para aprender, alimenta a memória e pode até ser útil no tratamento de doenças da mente. Esse conjunto de utilidades sempre fascinou o neurocientista Sidarta Ribeiro, formado em biologia pela Universidade de Brasília (UnB) e fundador do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
 A curiosidade e o encanto diante da importância do sonho para o aprendizado o fizeram mergulhar em pesquisa realizada durante mais de duas décadas e que resultaram em livro generoso sobre o tema.
O oráculo da noite — A história e a ciência do sonho é um ensaio multidisciplinar tão bem amarrado que, em certos instantes, o leitor esquece que está mergulhado em neurobiologia, sinapses e reações químicas neuronais. A parte fisiológica está presente em todo o livro — é, afinal, o material de pesquisa de Ribeiro —, mas ela vem combinada com um leque enorme de outras disciplinas. “O livro vem de muitas pesquisas diferentes, claro que tem muito mais pesquisas de outras pessoas”, garante o autor.
A psicanálise era inevitável, já que Freud foi quem voltou a olhar seriamente para os sonhos e a analisar seu impacto na constituição psíquica do ser humano. Mas Ribeiro também passeia pela história e pela antropologia para nos lembrar de como os povos nativos ameríndios têm os sonhos em alta conta, e pela literatura, com uma erudita coleção de citações que vão de textos gregos antigos a literatura contemporânea. “O livro tem muita história, narrativa ligada à antropologia, mas tem um viés biológico forte e isso foi uma coisa que tive que debulhar para criar uma narrativa acessível”, explica. “O livro fala de muita coisa diferente, conta a história da vida rapidamente, da vida na Terra, e, para entender o sonho humano, às vezes temos que voltar para Idade do Bronze, mas às vezes tem que voltar a 100 milhões de anos atrás.”
Ribeiro é muito enfático ao falar da importância dada aos sonhos pelas culturas ameríndias. São civilizações nas quais o relato onírico se transforma em material importante para tomar decisões cotidianas. Tanto os nativos norte-americanos quanto os das américas Central e do Sul servem de base ao cientista, que reconstitui partes inteiras da história desses povos e do continente por meio do tema. Falar sobre essas experiências é prática quase extinta no mundo Ocidental e há uma lacuna considerável deixada por essa ausência. “A capacidade de simular futuros possíveis por meio dos sonhos é uma coisa que os índios praticam muito, uma tentativa de prever futuro baseado no passado. Talvez isso seja o que esteja faltando para a civilização ocidental, ou pós-industrial. Estamos todos marchando para a catástrofe sem nos darmos conta disso e talvez isso tenha a ver com o fato de que as pessoas não sonham mais, ou elas sonham e não se lembram disso. O sonho não tem lugar na vida social, ninguém pergunta o que você sonhou. A gente perdeu uma capacidade de reflexão importante”, lamenta.
Com pós-doutorado em neurofisiologia pela Duke University, Ribeiro passou mais de uma década nos Estados Unidos debruçado sobre pesquisas que esmiuçavam a fisiologia do cérebro humano. Voltou para o Brasil com a intenção de fundar um instituto no qual pudesse repatriar capital humano e aprofundar a pesquisa em neurociência no Brasil. Chegou a trabalhar com Miguel Nicolelis no Instituto Internacional de Neurociências de Natal, mas um desentendimento com o neurocientista levou Ribeiro definitivamente para UFRN. Em entrevista, ele fala sobre a importância dos sonhos, mas também sobre o estado atual da pesquisa científica no Brasil. Por Nahima Maciel, do Correio Braziliense....
O Oráculo da noite – A história e a ciência do sonho
De Sidarta Ribeiro. Companhia das Letras, 460 páginas. R$ 79,90

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