segunda-feira, 11 de junho de 2018

OBRA PRIMA DE VAN MORRISON COMPLETA 50 ANOS


             
Bem mais do que um simples “passeio” pelo passado, ouvir determinados discos como “Astral Weeks” que Van Morrison gravou em 1968, é garantir um mergulho pelos labirintos intrincados da nossa mente, até encontrar o merecido repouso espiritual. Este é disco muito especial para mim e é claro, para muita gente esparramada pelo planeta . Trata-se do primeiro grande disco de Van Morrison, um dos meus grandes ídolos. Astral Weeks possui uma história tão singular quanto a música que dele sai e que o faz disco de cabeceira de artistas do nível de Bob Dylan, entre outros e possibilita uma visão mais apurada da arte desse genial e genioso músico irlandês...
Falar de Astral Weeks é falar de uma obra-prima que vira e mexe aparece entre os 5 melhores discos da história em qualquer lista dos melhores de todos os tempos. Se você perde tempo com essa bobagem de listas, pode conferir e verá que estou certo. Agora essa preciosidade incrível está fazendo 50 anos e o seu charme e importância permanecem intactos, comovendo e encantando as pessoas.
O disco significa uma virada na carreira de Van Morrison. Após deixar o Them e tentar a carreira na América, acabou fazendo um imenso sucesso com "Brown-Eyed Girl". Essa canção, gravada pelo pequeno selo Bang Records é uma das mais odiadas pelo próprio cantor, por tudo que ela representa. Vamos à longa história...
Van Morrison chegou à Nova York trazido pelo dono do selo, Bert Berns, que havia escrito entre outras músicas, "Here Comes the Night", gravada pelo próprio Them.
A convivência dele com Van tornou-se um imenso problema e os dois acabaram rompendo a parceria, já que o produtor queria que ele produzisse compactos de sucesso, o que desgostava o pequeno gênio irlandês. Porém, Van tinha um contrato com o selo e Berns não o queria liberar.
A situação agravou-se muito mais quando Berns morreu de um ataque cardíaco, no dia 30 de dezembro de 1967. Ilene Berns, viúva, culpou a Van pelo ocorrido e jurou que infernizaria sua vida, promessa que cumpriu à perfeição.
Como tinha o contrato em vigência, Ilene conseguiu manter Van não apenas fora dos estúdios, como o proibiu legalmente de fazer qualquer apresentação nos clubes de Nova York. A situação se tornou mais dramática quando ela descobriu que Van estava ilegalmente em Nova York e o denunciou para que fosse deportado. Esse último incidente acabou sendo superado com o casamento às pressas com sua então namorada, Janet Planet.
Após se casarem, o casal acabou indo para Cambridge, Massachusetts, onde Van poderia realizar alguns shows para sobreviverem. Van começou a tocar com estudantes locais, e no final acabou amigo do baixista Tom Kielbania, com quem montou um duo acústico.
Tom acabou conhecendo o flautista John Payne e agora o duo era um trio. Após quatro meses tocando, Van Morrison foi contatado pela Warner Bros, que queria adquirir seu passe, motivado pelo imenso sucesso de "Brown-Eyed Girl".
À essa época, a Warner tinha negócio com a Inherit Productions, ligada à Schwaid-Merenstein, fundada por Bob Schwaid e Lewis Merenstein. Merenstein foi quem tentou convencer Van a assinar, equanto Bob tentava livrá-lo do contrato com a Bang Records.
O contrato com a Bang poderia deixá-lo preso para sempre não fosse um enorme esforço para tentar quebrar o acordo. E que acordo!
Para se livrar da Bang, Van foi obrigado a gravar 36 músicas novas para o selo, o que foi feito, incrivelmente, em apenas um dia, sendo basicamente canções com voz e violão. Além disso, Van teria que ceder metade dos seus direitos autorais de qualquer compacto que lançasse até 12 de setembro de 1968 à Web IV (editora de Berns).
A Warner não gostou dessa idéia e rejeitou lançar algo do cantor no período. A situação só foi contornada quando Van concordou em ceder o direito de duas novas composições que posteriormente entrariam em Astral Weeks: "Madame George" e "Beside You".
Livre das amarras legais, Van Morrison entrou novamente em estúdio no dia 25 de setembro, pela primeira vez. Astral Weeks seria gravado em apenas três sessões: além dessa, outra que ocorreu no dia 1º de outubro e mais uma no dia 15 do mesmo mês, do ano de 1968.
Após deixar claro que não queria fazer discos pops e sim uma obra muito mais delicada, acústica, Lewis Merenstein saiu à cata de bons músicos. Segundo ele, Van conhecia e gostava de R&B, soul, mas não de jazz. E o que Van queria estava mais perto do jazz e por isso o produtor chamou o experiente baixista Richard Davis. Também acabou convidando o guitarrista Jay Berliner, o percussionista Warren Smith Jr. e o baterista Connie Kay, que fazia parte do Modern Jazz Quartet. Além deles, participaram o guitarrista Barry Kornfeld, em "The Way Young Lovers Do" e o antigo companheiro John Payne, também tocando sax soprano, além de flauta. Van ficaria nos teclados, violão e sax.
Van começou ensaiando as canções no violão e com a presença de Richard Davis, que aprendeu todas as linhas de baixo com Kielbania, que não participou das gravações.
Davis foi fundamental para o disco segundo Merenstein: "se você ouvir o disco verá que o baixo é o condutor do disco. Todos o seguem". Os músicos não gostaram muito do cantor, especialmente porque ficava quieto em seu canto, quase sem conversar. Sequer foram apresentados formalmente. "Ele era um estranho total e mantive a postura 'sem pagamento, sem trabalho' na época. Van não tinha muita idéia de como trabalhar e queria que nós 'improvisássemos'. Tive que explicar a ele que para improvisar como ele queria, precisávamos ter alguma base para podermos nos basear e que aí sim, o improviso pode nascer livremente", conta Davis.
Na primeira sessão, de 25 de setembro, quatro canções foram gravadas: as três inicialmente previstas - "Cyprus Avenue," "Madame George," e "Beside You." - e a faixa-título.
Como Payne não podia comparecer à primeira sessão, foi substituído por um músico jamais creditado, já que ninguém se lembrava de seu nome. Payne só apareceu na faixa-título quando Van queria tentar mais uma canção nova e após ter implorado ao produtor, irritado com sua ausência.
A segunda sessão foi frustrante, pois os músicos não conseguiam criar o clima ideal para as gravações. O restante do disco acabou sendo gravado na terceira e última sessão, no dia 15 de outubro. Inicialmente, seriam gravadas apenas "Sweet Thing" e "Ballerina", mas eles passaram muito tempo arrumado uma nova composição.
Van tentou várias canções até se fixarem em "Slim Slow Slider". "Ele era maluco e chegou com um caderno grosso cheio de letras e nem sei como ele decidiu por essa e foi um sucesso", relembra Payne.
As outras duas do dia foram "Madame George", que Van nega ser sobre um travesti como se foi especulado, e "Cyprus Avenue", essa última a favorita do cantor e de fãs nos shows futuros. "Cyprus Avenue" fala de uma rua de Belfast. Van conta que as duas foram escritas utilizando a técnica do "fluxo de consciência", imortalizada no livro Ulysses, do também irlandês James Joyce.
Merenstein teve muito trabalho para editar o disco e diminuir os improvisos e temia que o álbum fosse um tremendo fracasso de vendas, medo parcialmente explicável e que, de fato, aconteceu.
Astral Weeks teve esse título em uma história curiosa: segundo Van, ele estava com a frase "If I venture down the slipstream" na cabeça quando foi visitar seu colega, o pintor irlandês Cezil McCartney que tinha um quadro chamado 'Astral Weeks'. Ele gostou do título e se apropriou dele. Mas, o próprio pintor nega essa versão: "existiam vários quadros no meu estúdio e Van olhou para um e sugeriu o nome para um deles."
O disco saiu com as seguintes músicas:
Lado A
1. "Astral Weeks" – 7:00
2. "Beside You" – 5:10
3. "Sweet Thing" – 4:10
4. "Cyprus Avenue" – 6:50
Lado B
1. "The Way Young Lovers Do" – 3:10
2. "Madame George" – 9:25
3. "Ballerina" – 7:00
4. "Slim Slow Slider" – 3:20
Apesar das vendagens modestas, o disco seria aclamado como um clássico e ao longo dos anos seria influência direta para gente como Elvis Costello, Sting, entre outros e daria a Van Morrison uma credibilidade que o manteria no ápice da carreira por vários anos.

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